Assim que souberam da decisão do juiz de instrução Carlos Alexandre de manter José Sócrates em prisão preventiva, os advogados decidiram que tinham de reagir de imediato. Dois dias bastaram para que o recluso 44 do Estabelecimento Prisional de Évora respondesse, pelo próprio punho, à questão formulada pelo DN e pela TSF.
A pergunta, feita por escrito, pretendia saber se o ex-primeiro-ministro compreende a posição do Ministério Público (MP) de manter a medida de coação mais grave, depois de, três dias antes, ter proposto a alteração para prisão domiciliária com pulseira eletrónica. O MP alegou que nesta fase da investigação ainda subsiste o perigo de perturbação de recolha e conservação de prova e também, ainda que de forma mais diminuta, o risco de fuga.
Sem perder tempo com rodeios, José Sócrates acusa Carlos Alexandre e Rosário Teixeira, o procurador que conduz a investigação da Operação Marquês, de tomarem decisões motivados pelo ressentimento. "Julgo não me enganar quando vejo o ressentimento como causa do acinte e do azedume tão evidentes nas recentes decisões do senhor procurador da República e do senhor juiz de Instrução", começa por responder num documento com três parágrafos, acrescentando: "O que considero extraordinário é que esse ressentimento resulte do facto de eu me ter limitado a exercer um direito que a lei me concede - dizer não a ser vigiado por meios eletrónicos. Como se, para estas autoridades judiciárias, o exercício legítimo de direitos constitua uma impertinência, um desaforo, um desrespeito para com a justiça." O ex-primeiro-ministro, em prisão preventiva há seis meses por suspeitas de corrupção passiva para ato ilícito, fraude fiscal agravada e branqueamento de capitais, diz que a atitude do juiz e do procurador assentam numa "certa cultura judiciária" que subverte os princípios da ação penal democrática. "A ação penal democrática funda-se - e legitima-se - na liberdade, nos direitos individuais e nos limites que o Estado se impõe a ele próprio. Este despacho do senhor juiz de Instrução e a promoção do Ministério Público a que dá seguimento são estranhos a essa cultura, pertencem a outra família, à da ordem, da submissão, da obediência - para ela, sim, os direitos existem, mas para serem utilizados com parcimónia, quando nós quisermos, quando nós dissermos, como nós quisermos, para o que nós quisermos." Assumindo o papel de acusador, José Sócrates afirma que "o poder que exerceram [o juiz e o procurador] não foi o do direito, mas o da força".
Cavalgando a alegação reiterada de que está preso há seis meses sem acusação e sem que lhe apresentem provas dos crimes de que é suspeito, o ex-chefe do governo conclui que "todavia, não raro o excesso, de força e de ressentimento, atraiçoa - há excessos de força que só expõem fraqueza. Tal é o caso e este é o ponto a que chegámos".
Noutros escritos a partir da cadeia, José Sócrates tem insistido na tese de que "é vítima de um processo político", queixando-se de que a sua prisão serve para "melhor investigar, para calar e para humilhar". Agora, e em sintonia total com os seus advogados, diz que o facto de ser o único preso preventivo desta investigação se deve a ressentimento, subscrevendo assim as palavras do seu advogado, João Araújo, que acusou Carlos Alexandre e Rosário Teixeira de "vingança mesquinha".